Ao longo da história, o arminianismo foi frequentemente difamado por setores calvinistas, a ponto de muitos arminianos autênticos hesitarem em assumir essa identidade. Esse fenômeno persiste, apesar de o arminianismo ser, de fato, a corrente majoritária no protestantismo cristão.
Muitas pessoas defendem convicções genuinamente arminianas sem se darem conta disso e, por vezes, até rejeitam o termo. Tamanha é sua difusão que mesmo em contextos calvinistas mais restritos há quem professe, ainda que inconscientemente, a teologia arminiana.
Este texto tem como propósito ajudar leitores que compartilham da cosmovisão arminiana a identificar sua posição doutrinária com clareza e confiança. Para isso, apresentamos dez perguntas essenciais que exploram os pilares dessa tradição teológica e seus contrastes com o calvinismo.
1. Você acredita que a morte de Cristo na cruz foi por toda a humanidade?
- Se sua resposta for sim, você compartilha um dos fundamentos essenciais do arminianismo, uma posição que encontraria resistência em ambientes calvinistas.
- Esta questão é, possivelmente, o mais evidente ponto de divergência entre arminianos e calvinistas.
- A maioria dos teólogos calvinistas defende que o sacrifício de Cristo se destinou exclusivamente a um grupo específico de pessoas, embora haja controvérsia sobre se o próprio João Calvino sustentava essa interpretação.
- Se você acredita que o sacrifício de Cristo se limitou apenas àqueles predestinados à fé, sua posição se alinha ao calvinismo e se distancia do pensamento arminiano.
2. Você crê que a natureza humana está tão corrompida que ninguém pode conquistar a salvação por mérito próprio, nem mesmo exercer fé em Cristo sem a intervenção prévia da graça divina?
- Se sua resposta for sim, sua posição teológica está em perfeita harmonia com os ensinamentos de Jacó Armínio e do arminianismo autêntico.
- Embora os calvinistas também defendam a doutrina da total depravação humana, eles frequentemente propagam a ideia equivocada de que os arminianos a rejeitam. Isso contradiz o fato de que praticamente todos os teólogos arminianos reconhecidos endossam explicitamente essa perspectiva.
3. Você acredita que os seres humanos podem resistir à influência da graça divina?
- Se sua resposta for sim, você subscreve outro princípio fundamental do arminianismo, claramente expresso no lamento de Jesus: “Jerusalém, Jerusalém, quantas vezes quis eu reunir teus filhos… mas vós não o quisestes” (Mateus 23:37).
- A tradição calvinista sustenta que Deus predeterminou quem abraçará a fé. Para viabilizar essa resposta, Ele convoca os eleitos por meio de um chamado irresistível que subjuga completamente a vontade humana, tornando impossível qualquer resistência ao convite.
- Em contraste, a teologia arminiana defende que, embora Deus genuinamente deseje a salvação universal, quando Ele capacita alguém para a fé, o faz preservando a integridade da resposta humana, permitindo que o indivíduo ainda possa rejeitar a atuação do Espírito Santo. Assim, a fé não é uma consequência inevitável ou automática da graça capacitadora.
4. Você crê que a regeneração espiritual (o “novo nascimento”) ocorre como resultado da sua fé em Jesus?
- Se sua resposta for sim, você adere a um princípio essencial da teologia arminiana e provavelmente não se alinha à tradição calvinista.
- A teologia calvinista defende que Deus necessariamente concede a regeneração espiritual como um ato prévio, capacitando o indivíduo a responder com fé. Sem essa vivificação preliminar, nenhuma pessoa seria capaz de exercer fé genuína.
- Em contrapartida, os arminianos sustentam que a regeneração ou novo nascimento é uma consequência da fé, não sua precondição.
- Na perspectiva arminiana, quando uma pessoa confia em Cristo, estabelece-se uma união vital com Ele, e somente a partir desse vínculo de fé é concedida a nova vida espiritual. Ninguém participa dessa renovação sem estar unido a Cristo, como evidenciado em João 3:16: “todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”.
5. Você acredita na doutrina da eleição divina?
- Se sua resposta for sim, isso não o exclui do pensamento arminiano, pois arminianos também afirmam essa doutrina bíblica.
- A tradição calvinista defende uma eleição incondicional: Deus escolhe indivíduos para a salvação por decreto soberano, independentemente de qualquer resposta de fé prevista ou real.
- Em contraste, a teologia arminiana compreende a eleição como fundamentada “em Cristo”. Isso significa que todos aqueles que estão incorporados “em Cristo” são considerados eleitos, sendo a fé o meio indispensável para essa união vital. Portanto, a eleição está intrinsecamente relacionada à fé como resposta humana à graça divina.
6. Você acredita na doutrina da predestinação?
- Se sua resposta for sim, isso não o desqualifica como arminiano, pois a teologia arminiana também incorpora o conceito bíblico de predestinação, embora com uma interpretação distinta.
- A perspectiva arminiana entende a predestinação como o decreto divino que assegura a salvação final daqueles que creem, não como uma determinação prévia de quais indivíduos específicos exercerão fé.
- Esta posição contrasta com a interpretação calvinista, que geralmente entende a predestinação como a escolha divina incondicional de indivíduos específicos para receberem o dom da fé e, consequentemente, a salvação.
7. Você acredita na segurança eterna da salvação?
- Esta questão fundamental indaga se os crentes genuínos podem sofrer “naufrágio na fé” e perder a salvação, ou se, uma vez que a fé autêntica é estabelecida, a salvação final permanece garantida incondicionalmente.
- Se sua resposta for sim, que a segurança eterna existe, isso não o exclui necessariamente do arminianismo, pois há diversidade de pensamento sobre este tema.
- Há controvérsia histórica sobre se o próprio Jacó Armínio defendia explicitamente a possibilidade de crentes verdadeiros abandonarem a fé.
- Os remonstrantes – primeiros defensores do arminianismo – inicialmente se mantiveram neutros sobre a questão, mas depois desenvolveram a posição de que crentes genuínos podem, de fato, apostatar da fé e perecer eternamente.
- Se sua resposta for não, que não há segurança eterna incondicional, você se alinha com uma convicção predominante entre muitos arminianos contemporâneos e certamente encontraria incompatibilidade no ambiente teológico calvinista.
- Todos os teólogos calvinistas defendem invariavelmente a segurança eterna incondicional (alguns em termos absolutos; outros entendem que tanto a fé inicial quanto a perseverança são manifestações necessárias da eleição incondicional).
8. Você acredita na teoria da expiação penal substitutiva?
- Independentemente de sua resposta ser sim ou não, sua posição permanece compatível com o pensamento arminiano, pois há diversidade teológica sobre este tema.
- Essa teoria sustenta que a morte de Cristo foi um pagamento efetivo pela penalidade do pecado. Ela se baseia na premissa de que a justiça divina exige punição, e que a justa indignação de Deus foi redirecionada dos pecadores para Jesus Cristo, que assumiu voluntariamente o papel de substituto penal.
- Essa interpretação é adotada pela maioria dos teólogos calvinistas e por uma parcela significativa dos arminianos (especialmente os que se identificam com o “arminianismo reformado”). No entanto, alguns pensadores arminianos questionam a noção de que Deus infligiu punição direta sobre seu próprio Filho.
- É historicamente relevante notar que o próprio Jacó Armínio endossava explicitamente a compreensão penal da expiação em seus escritos.
9. Você acredita que Deus possui conhecimento completo de todos os eventos futuros?
- Se sua resposta for sim, sua posição está perfeitamente alinhada com a tradição arminiana predominante.
- Tanto os teólogos calvinistas quanto a maioria expressiva dos arminianos afirmam que Deus conhece perfeitamente e com absoluta certeza todos os aspectos do futuro.
- É importante destacar que alguns pensadores arminianos sustentam que rejeitar a onisciência divina abrangente é um desvio fundamental do teísmo cristão clássico. Eles argumentam que aqueles que negam essa presciência completa não podem ser classificados como arminianos.
- Esta questão distingue o arminianismo clássico de correntes mais recentes, como o “teísmo aberto”, que, embora compartilhem certas ênfases quanto à liberdade humana, divergem significativamente neste aspecto da doutrina de Deus.
10. Você acredita na soberania absoluta de Deus sobre toda a criação?
- Se sua resposta for sim, isso é plenamente compatível com a teologia arminiana, pois tanto calvinistas quanto arminianos afirmam a soberania divina. A diferença, contudo, está em como essa soberania se relaciona com a liberdade humana.
- Certos teólogos calvinistas definem soberania em termos de um determinismo divino absoluto, onde Deus ordena e predetermina meticulosamente todos os acontecimentos, reduzindo a escolha humana a uma mera aparência.
- Em contraste, os arminianos afirmam uma liberdade humana genuína, defendendo que os seres humanos fazem escolhas autênticas e significativas, o que fundamenta sua responsabilidade moral pelos pecados.
- A perspectiva arminiana da soberania reconhece que Deus tem poder e autoridade supremos para realizar tudo o que deseja, e nada acontece sem sua ação direta ou permissão soberana.
- Os arminianos sustentam que Deus é suficientemente soberano para conceder livre-arbítrio significativo às suas criaturas sem que isso diminua seu controle providencial sobre a história.
- Essa compreensão é profundamente motivada pelo compromisso com a santidade do caráter divino, afirmando duas verdades cruciais: Deus não pode ser considerado o autor ou a causa direta do mal moral, e os seres humanos mantêm autêntica responsabilidade por suas transgressões.
Conclusão
Em suma, a teologia arminiana oferece uma rica estrutura doutrinal que equilibra a soberania divina e a responsabilidade humana. Como arminiano, você pode afirmar com confiança: a expiação universal de Cristo; a completa depravação humana que torna a fé impossível sem a intervenção divina; a possibilidade de resistência à graça de Deus; a eleição fundamentada na união com Cristo pela fé; a predestinação dos crentes à glória final; posições diversas sobre a segurança eterna; a expiação substitutiva onde Cristo assume nossa penalidade; a perfeita presciência divina sobre o futuro; e a soberania absoluta de Deus, que inclui a capacidade de conceder autêntica liberdade às suas criaturas.
Como evidenciado nesta síntese, o arminianismo representa a corrente teológica predominante no evangelicalismo histórico, e não há razão para hesitação ou constrangimento em se identificar com essa robusta tradição bíblica.
Esta publicação é uma tradução e adaptação livre do artigo original intitulado Survey: Are You an Arminian and Don’t Even Know It?, disponível em: https://evangelicalarminians.org/survey-are-you-an-arminian-and-dont-even-know-it-2/
Para se aprofundar mais na teologia arminiana, recomendo as seguintes leituras essenciais:
- OLIVEIRA, Ivan de. FACTS: os cinco pontos do arminianismo. São Paulo: Editora Reflexão, 2016.
- DANIEL, Silas. Arminianismo: a mecânica da salvação. 5. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2017.
- OLSON, Roger E. Teologia arminiana: mitos e realidades. Tradução de Wellington Carvalho Mariano. São Paulo: Editora Reflexão, 2013.
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